Opinião do Especialista Segurança Pessoal

EMPREGO DE ARMAS DE FOGO PARA DEFESA

Publicado por Vinícius Cavalcante

A cada cidadão consciente faculta estabelecer por quais meios defenderá a si e os que lhe são caros. Ao contrário do que se convencionou alegar ultimamente no Brasil, o emprego de armas de fogo para a defesa ainda é um recurso amplamente válido desde que observados certos preceitos indispensáveis. Em tempos recentes, tendo a propaganda anti-armas largamente difundida, muito se vem propagando uma falaciosa estatística segundo a qual a esmagadora maioria das pessoas que se valeram de armas de fogo para defesa própria ou de terceiros vieram a sucumbir no embate com criminosos.

Trata-se de uma “verdade” tremendamente discutível uma vez que ninguém jamais soube exatamente qual a abrangência e a representatividade do universo dos casos estudados. Os advogados do amplo desarmamento civil parecem fechar os olhos para o fato lógico de que um cidadão, em sã consciência, se valendo de uma arma para defender-se, ao balear um criminoso dificilmente ficará esperando a chegada dos agentes de autoridade policial para admitir a situação de legítima defesa, apresentar sua arma e complicar-se respondendo ao correspondente processo criminal. Na verdade não há estatísticas confiáveis de combates onde o cidadão se saiu vitorioso, apenas porque os cidadãos simplesmente se abstém de procurar as autoridades para assumir os feitos dessa natureza!
O principal problema é que o uso de uma arma registrada com propósito de defesa na via pública ou no lar vai exigir, uma qualificação e um adestramento que o cidadão normalmente não dispõe, não pode ou, por ignorância ou preconceito, não quer adquirir. Quem quer que pretenda empregar uma arma para propósito de defesa deve obrigatoriamente estar capacitado para isso.

Armas são um instrumento de defesa de último recurso e não devem ser empregadas como forma de coerção em discussões acaloradas, sob forte emoção ou sob efeito de álcool. Muito boa gente já encontrou o caminho da prisão por sacar armas por motivos fúteis e se ver compelido a responder “na bala” a provocações do tipo “onde você comprou a arma não lhe venderam a coragem para puxar o gatilho” ou “isso é coisa que só funciona mão de homem”. Se você, com a cabeça quente, diz e até faz coisas das quais vem a se arrepender em seguida; ou se é apenas para bater boca, faça-o desarmado(a) pois quaisquer disparos feitos sem necessidade correrão sempre por sua própria responsabilidade. Sintetizando, quem quer que possua uma arma deve estar consciente de que jamais deverá apontá-la para aquilo que não deseje realmente destruir. Não se saca de armas sem necessidade e muito menos as aponta “de brincadeira”, para objetos ou pessoas.

De nada adianta comprar uma arma na pressuposição de que apenas fará uso dela numa situação crítica real. Mesmo passando pelo treinamento num curso de tiro sério – há algum tempo pré-condição para aquisição legal de armas de fogo por civis no Brasil – você não deverá manter a arma guardada indefinidamente sem adestrar-se. Seria algo como tirar carteira, comprar um carro e deixá-lo guardado na garagem, apenas para sair caso surgisse uma emergência e houvesse de levar alguém para o hospital…

É imprescindível atirar com alguma periodicidade a fim de garantir que você esteja pronto para fazê-lo numa situação crítica real.

A primeira questão importante envolvendo o uso de armas é a do auto-conhecimento. Você seria capaz de tirar a vida de alguém, em legítima defesa, numa situação de combate com arma de fogo? Se a resposta foi intimamente afirmativa passemos à questão seguinte…

A segunda questão envolve o condicionamento mental de quem opta pelo uso defensivo de uma arma de fogo. Numa situação de necessitar defender-se com armas o cidadão deve estar condicionado para tentar detectar seus potenciais alvos antes que eles (os alvos) tenham a possibilidade de investir contra ele próprio. Com armas em casa e mais ainda portando-as na cintura, você deverá modificar sua postura mantendo-se constantemente alerta pois, no embate com criminosos, normalmente sobreviverá aquele que conseguir visualizar a intenção do adversário, sacar rapidamente e disparar contra seu alvo com maior precisão possível. Igualmente, tenha em mente que uma arma é um instrumento bastante cobiçado e que, sabendo que você está armado, criminosos não terão o mínimo escrúpulo em te atacar de forma dissimulada e covarde, apenas para poderem apoderar-se de seu instrumento de defesa. Uma vez armado você deverá estar atento para proteger a você e a sua arma, negando a surpresa ao adversário. Não se descuide da condição amarela!…

Lembre-se, “moscas” são mortas com inseticida e você, em seu treinamento, estará tentando simular disparos que atinjam seu oponente rapidamente e em pontos que causem a incapacitação deste agressor. A combinação de velocidade de saque e precisão de disparos só pode ser alcançada mediante treinamento constante, devidamente supervisionado por um instrutor habilitado.

Em seu treinamento procure simular as condições mais difíceis pois, quando num enfrentamento real você disparará contra um alvo que não ficará parado por mais do que uma fração de segundos e que com certeza revidará seus disparos, se você lhe der mínima oportunidade para que ele o faça. De qualquer forma, não se esqueça de que nos combates com armas de fogo “mais vale um acerto menos rápido do que um rapidíssimo erro” o qual pode vitimar pessoas inocentes!

A escolha da arma – se pistola ou revólver – é uma questão de caráter pessoal Vejamos algumas das principais características das armas de fogo…

            Primeiramente os Revólveres:

  • São armas de fogo portáteis tradicionais, dotadas de várias câmaras de disparo num cilindro rotativo. São as mais difundidas no Brasil;
  • Possuem mecanismos simples, que requerem menos cuidado de manutenção do que as pistolas
  • Possuem uma tradição de confiabilidade mecânica e baixo histórico de falhas de disparo. Se um cartucho falhar por quaisquer motivos, uma nova puxada do gatilho colocará outro cartucho em posição;
  • Os revólveres normalmente “digerem” qualquer tipo de munição ou cargas nos seus respectivos calibres. Munições antigas, mal recarregadas ou com carga de pólvora mais fraca que a usual podem ser disparadas sem afetar o funcionamento da arma;
  •  Diferentemente das pistolas, pode ser mantido municiado, em condições de pronto uso, por grandes períodos de tempo, sem comprometer-lhe a capacidade de disparo;
  • Comparativamente possui menor poder de fogo (quantidade de tiros disponíveis), sendo que, na maioria dos revólveres a capacidade de tiros varia ente 5 e 8 cartuchos.
  • A extração dos cartuchos disparados se faz manualmente, abrindo a armação da arma, basculando o tambor para fora, virando o cano para cima e apertando a eixo que é chamado de vareta do extrator;
  • O remuniciamento da arma tende a ser mais lento na medida que se deve inserir cada cartucho em sua câmara. Para remediar tal problema, podem ser empregados recarregadores rápidos (chamados speed loaders).

As Pistolas:

  • São armas mais complexas que os revólveres e mais suscetíveis à má conservação e à sujeira em seus mecanismos;
  • Numa única câmara os cartuchos de munição provenientes do carregador são alimentados e automaticamente extraídos em face de cada disparo. Os cartuchos se revezam numa mesma câmara e o esforço de recuo expele o cartucho vazio, ao mesmo tempo em que alimenta um novo, deixando a arma pronta para novo disparo;

Uma maior quantidade de munição é contida em carregadores destacáveis, embutidos no punho da arma. Normalmente podem ser encontrados carregadores de 5, 7, 8, 10, 12, 15, 17, 19 e 20 tiros (ou até mais, considerando os modelos tipo “caracol”) proporcionando ao atirador quantidade de disparos inigualável para um revólver;

  • Os carregadores de pistolas permitem que a arma seja remuniciada com muito mais rapidez;
  • A cadência de tiros (velocidade com os qual os tiros são disparados) é normalmente maior que nos revólveres;
  • O desenho dos projéteis (normalmente chamados pelos atiradores de “pontas”) pode ocasionar dificuldade de alimentação na câmara e falha no disparo;
  • O mau estado de conservação das munições tende a ocasionar falhas muito mais perigosamente comprometedoras do que nos revólveres;
  • Uma pistola não deve ser deixada guardada com seu carregador municiado na capacidade máxima por muito tempo a fim de não forçar demasiadamente a mola que impulsiona os cartuchos para a câmara. Molas fracas ou “cansadas” concorrerão para falhas de alimentação da câmara de disparo;

Há fervorosos advogados de ambos tipos de armas e algumas discussões sobre a falta de confiabilidade das pistolas parecem-nos completamente fora de propósito. A esmagadora maioria das falhas de funcionamento presenciadas pelos autores deveu-se à munições velhas ou mal conservadas as quais comprometeram o disparo. Como um utensílio que dependa de pólvora para seu funcionamento, um cartucho de munição teme a umidade e se mantido em um local seco, sob temperatura normal, tende a manter suas características por mais tempo do que a garantia do fabricante estabelece (normalmente dois anos). Com munições modernas, de cargas de pólvora adequadas, as pistolas modernas tendem a funcionar perfeitamente.             Acreditamos que, qualquer que seja a arma escolhida, o mais importante é que o usuário esteja convenientemente adestrado no seu manuseio e capacitado a realizar disparos precisos. Você deve acostumar-se a desmuniciar e municiar o tambor de seu revólver, a ponto de conseguir fazer isso enquanto observa aquilo que se passa à sua volta. Usuário de uma pistola semi-automática deve desenvolver intimidade no municiamento do carregador no caso de pistolas, alimentando a câmara e extraindo o cartucho de munição posto para pronto disparo. A substituição do carregador vazio por outro cheio deve ser repetida várias vezes para conveniente familiarização.

Uma vez que são instrumentos mecânicos, revólveres e pistolas deverão ser mantidos sempre limpos, devidamente lubrificados e livres de resíduos de ferrugem, poeira e pólvora. Tão importante quanto à escolha da arma é a seleção do calibre da mesma. Simplificando o assunto para aqueles que não são do ramo, o calibre seria uma associação do diâmetro e tipo dos projéteis que as armas de fogo disparam. Trata-se normalmente de uma denominação que permite a adequação entre a arma e a respectiva munição que ela dispara. É importante que exista tal referencial pois cartuchos de um mesmo diâmetro (ou dimensões) podem possuir potência ou características que o tornem específico para um tipo de arma e inadequado para outro. Por isso eles são apresentados com um número (o diâmetro aproximado, expresso em milímetros ou polegadas) seguido de um designativo que pode ser o nome do seu criador, de um adjetivo ou de outras referências que o tornem mais específico.

Nossa legislação sempre foi extremamente restritiva no que tange aos calibres de arma de fogo permitidos para uso civil; contudo, na gestão do Presidente Bolsonaro esse absurdo histórico foi amplamente revisto e a legislação foi flexibilizada para permitir que o cidadão possa comprar, possuir e eventualmente portar, armas de calibres como  o 9mm Parabellum (9mm x 19mm), o .40” S&W, o .45” ACP e o 357” Magnum.

            O êxito da arma de fogo como um instrumento defensivo está em desferir contra o agressor um impacto de tal ordem que o faça cessar o cometimento de sua ação. Se a agressão sofrida, em curso ou eminente, for suficientemente grave para justificar que se recorra defensivamente à arma de fogo, não caberá aqui a discussão de se o tiro poderá ou não vitimar o agressor. O importante é pará-lo e para isso há de se atirar com precisão. Não estamos fazendo a apologia do assassinato, mas sim esclarecendo aos leitores de que, no mundo real, aqueles que se dispõe a atacar você com uma arma, são violentos, covardes, normalmente o fazem bastante motivados e só cessam seu intuito se você conseguir feri-lo gravemente.

            À cada um dos calibres de armas de fogo está associada uma quantidade de energia, a qual ele consegue transferir sobre o alvo. É o chamado coeficiente de “Stoping Power” das munições. O fenômeno dessa transferência da energia, a maneira com que esse projétil atinge o alvo e o efeito que ele causa são elementos do maior interesse.

            Vejamos rapidamente como funciona o cartucho de munição…

            Posicionado dentro da câmara da arma o cartucho conta com uma espoleta iniciadora encravada em sua base. Essa espoleta é atingida por um pino que a percute (percussor da arma) provocando a deflagração (queima) da pólvora contida no interior do cartucho. A elevada pressão da expansão dos gases gerada pela queima da pólvora impele o projétil através do interior do cano da arma, forçando-o de encontro às estrias das paredes internas (chamadas de raias ou raiamento). O raiamento faz com que o projétil, propulsado pelos gases da queima da pólvora, gire em torno do próprio eixo conferindo-lhe direcionamento e estabilização para o seu vôo até o alvo. A expansão dos gases enquanto no interior do cano, confere ao projétil velocidade e sua passagem pelo cano, a direção. Quanto mais longo o cano da arma maior a sua precisão. O projétil sai do cano, atirador então sente na mão o recuo da arma e vê um clarão na extremidade do cano. O solavanco do recuo é ocasionado pela quantidade de energia do disparo que não foi aproveitada no impulsionamento do projétil e o clarão pelos grânulos de pólvora que ainda queimam na parte final da trajetória no cano; porém quando isso se faz sentir para o atirador o projétil já saiu do cano e seguirá a trajetória para o qual foi direcionado. Considerando armas de comprimento de canos diferentes atirando com uma mesma munição (como a de calibre .38 S&W/SPL), quanto mais comprido for o cano da arma maior será o aproveitamento da queima da pólvora para impelir o projétil, conseqüentemente esse projétil terá maior velocidade de saída e transferirá sobre o alvo uma maior carga de energia incapacitante.

Armas de canos mais longos são intrisecamente mais precisas e apresentam recuos menores. Se empregando uma arma de cano curto (no caso um revólver .38SPL de cano de duas polegadas) o projétil percorrerá o interior do cano mais rapidamente, não aproveitará toda a energia da queima em virtude do pouco comprimento disponível para essa expansão, o que resultará em um maior recuo e um maior clarão do que se empregássemos uma mesma arma de cano de seis polegadas. O projétil disparado sairá do cano de 5,8cm com uma velocidade inferior (do que o disparado anteriormente pela arma de 15,2 cm) e conseqüentemente atingirá o alvo com menor energia.  

            Sempre que se aborda a questão do tiro defensivo se discute a existência de uma combinação de arma (calibre) e munição ideal, capaz, com 100% de chance, de parar um adversário com um só disparo. Há muito tempo, diversos especialistas renomados (e digo especialistas de verdade e não aqueles violenciólogos que se arrogaram tais qualificações e apareceram às vésperas da votação do referendo de 2005, escrevendo livros no afã de provar suas teses desarmamentistas) se debruçaram sobre a tarefa de responder tais questionamentos sem contudo poder apresentar uma resposta definitiva. Não se trata de incompetência mas da virtual impossibilidade de tentar impor tais regras à balística terminal. Estamos falando de policiais, militares e atiradores, os quais possuem (ou possuíram) real vivência de combate com armas, que lutaram em guerras, que enfrentando a violência das ruas travaram inúmeros tiroteios, que conhecem armas e amealharam, ao longo de suas vidas um conhecimento enorme de balística e medicina legal. Refiro-me a pessoas que, por profissão, viviam o dia à dia do combate com armas de fogo e não apenas a acadêmicos que se dedicavam a procurar as obras e os fatos que lhes respaldassem o ponto de vista comprometido e a produzir discutíveis estatísticas; falo de gente como Bill Jordan, Evan Marshall, Jeff Cooper,  Jim Cyrillo, James D. Mason, Massad Ayoob, Chuck Taylor ou, no Brasil, de Sérgio Colo Moore, Neylton T. S. Matos, Laércio Gazinhato, José Joaquim D´Andrea Mathias, Lincoln Tendler,… técnicos e pesquisadores sérios, cujos nomes, curiosamente, não aparecem uma única vez nas obras há pouco mencionadas.

            Os seres humanos são diferentes entre si, da mesma forma que as situações de combate com armas de fogo também o são. Há pessoas que foram baleadas repetidas vezes com armas de grosso calibre e estão vivas até hoje para contar a sua história, enquanto outros sucumbiram atingidos por projéteis de calibres fracos como o .22” LR e o 6,35mm. Além da diferenciada compleição física, capacidade de resistência humana e da motivação pessoal de cada um, diversos outros fatores concorrem para tornar ainda mais complicada a questão:

a) O estado de conservação da munição, sua idade e a degradação de seu propelente (pólvora) reduzindo a velocidade com que o projétil atinge o alvo;

b) O ângulo e o local em que o projétil atinge o alvo, fazendo com que nenhuma parte vital do corpo do alvo seja atingida;

c) A existência de anteparos na trajetória entre a boca do cano e o alvo que deformem ou desacelerem o projétil diminuindo sua impactação etc.

d) O tipo de projétil e o seu desenho, o qual pode favorecer a transfixiação (atravessar) do corpo do alvo – no caso dos projéteis ogivais – ou a deformação e uma maior transferência da energia da munição sobre o alvo humano – no caso das munições expansivas ou fragmentáveis;

            Como se vê, não se pode assegurar com 100% de certeza que alguém, atingido por um disparo do calibre X obrigatoriamente será posto fora de combate. O cinema é a maior fonte de desinformação sobre o poder de parada das munições e quem acreditar naquilo que viu e esperar que se repita num combate real, pode até morrer devido à tal crendice. No mundo real, os criminosos, mesmo os mais franzinos, não tem o hábito de voar para trás ao serem atingidos no peito por disparos de armas curtas, mesmo das pistolas e revólveres mais poderosos. Criminosos sob o efeito de drogas tem suas terminações nervosas anestesiadas e se tornam muitíssimo mais resistentes à dor. Há casos em que resistiram a vários disparos antes de finalmente sucumbir.

            No mundo real o autor já viu e pode testemunhar em São Paulo, um criminoso magro, de aproximadamente uns 65kg, que sob o efeito do crack, numa troca de tiros com policiais, recebeu seis tiros de pistola no calibre .380Auto, no peito e barriga, esgotou toda a munição do seu revólver e ainda correu por quase 100m antes que os ferimentos realmente lhe incapacitassem. Ele perdeu muito sangue, morreu, mas ainda, antes disso, deu um bocado de trabalho.

            Embora por anos o calibre mais poderoso de pistola admitido para o uso civil no Brasil, o .380Auto sempre foi tido nos Estados Unidos (onde não há restrição quanto ao calibre de armas curtas para os civis)  apenas como o minimamente satisfatório para propósitos defensivos.

            No livro “A Hora da Vingança” (transformado em filme pelo cineasta Steven Spielberg), no qual narra a missão de um grupo do serviço secreto israelense especialmente formado para “eliminar” os terroristas responsáveis pelo massacre dos atletas judeus na Olimpíada de Munique (1972), o autor George Jonas exemplifica que o calibre da arma de fogo dos agentes era o (risível?) .22Curto. Esclarecia porém que os atiradores eram capazes de disparar suas pequenas pistolas contra o centro  de alvos do tamanho de cabeças a uma distância de 6m! Disparando uma rápida seqüência de dois tiros de  .22 Curto e acertando-os no centro da face do adversário, não há quem possa escapar com vida, porém se esses mesmos tiros o atingissem um braço ou a barriga, certamente os agentes ainda teriam de enfrentar um inimigo tornado mais furioso pelos ferimentos que lhe foram causados pela “armazinha de brinquedo”…

            O efeito incapacitador de um projétil de arma de fogo está relacionado ao local do corpo do adversário que são efetivamente atingidos pelo tiro. Se o tiro não atingir uma ponto que coloque o adversário fora de combate, poder-se-á esgotar todo um tambor de revolver ou carregador de pistola sem que se alcance o objetivo desejado. Como no exemplo citado do jovem criminoso paulista, o agressor pode até perecer em face da gravidade de todos os ferimentos impostos porém nenhum daqueles disparos foi capaz de fazê-lo cessar a ação no momento desejado pelo fato de não tê-lo atingido num ponto realmente sensível. Isso faz com que o atirador obrigatoriamente se empenhe em ser preciso, e agrupar seus tiros, maximizando o efeito terminal de transferência de energia sobre o alvo. Não há calibres ou “balas” mágicos! O que se pode afirmar com razoável grau de certeza é que projéteis de calibres mais poderosos, como o .45ACP, tem uma maior probabilidade de promover a incapacitação de um agressor com um único disparo do que o anêmico 6,35mm, o qual, infelizmente no Brasil, só é comercializado na sua forma ogival jaquetada.

            A associação do tipo de projétil com o Stoping-Power é clara. À cada tipo de munição está associado um efeito balístico diferente, o qual pode ser a perfuração do alvo, a deformação, a fragmentação e a total transferência de energia etc. A combinação de desenho do projétil, seu peso e a carga de pólvora que o impulsiona pode compensar em parte as limitações de poder de parada de um determinado calibre. Apenas para exemplificar, uma antiga munição de pistola Mag-Safe no calibre 6,35mm, disparada de um cano de duas polegadas, chega a transferir sobre o seu alvo a mesma quantidade de energia do que uma munição ogival jaquetada (mais comum) no calibre .380Auto disparada numa pistola de três ou quatro polegadas de cano!

            A diversidade de tipos de projéteis é enorme. No Brasil, no entanto, a importação de munição para propósitos defensivos não é algo comum e o cidadão fica normalmente limitado aos modelos e calibres oferecidos pela empresa CBC. Assim como na conceituação das armas, imaginamos que o cidadão deve saber identificar e conhecer um pouco mais modelos de munições e seus efeitos balísticos.

Embora com seu impacto, as munições transfiram energia de forma destruidora sobre seus respectivos alvos, cada munição provoca um efeito balístico diferente.

Ela objetiva penetração (no caso de projéteis ogivais, mais perfurantes) ou impactação por deformação (no caso dos projéteis tipo ponta oca ou hollow-point e frangíveis). Escolha o tipo de munição mais adequado à arma e a situação tática que você espera enfrentar e treine com ela. Sabemos que isso tem custo, mas lembremo-nos que de pouco adianta treinar tiro com uma munição mais fraca (com um recuo suave e estampido atenuado) que permitem firmar a mão e acertar todos os tiros, e surpreender-se negativamente com o solavanco da arma na mão e o ruído da munição +P usada nas condições reais!

Nós não podemos pretender esgotar todas as considerações acerca do emprego de uma arma de fogo no escopo de um único artigo! Quem quer que pretenda utilizar uma arma, tanto no seu trabalho (como policiais e agentes de segurança privada), quanto civis (que a adquirem para defesa própria ou de seu patrimônio) devem estar familiarizados com ela e treinar sempre. Normalmente, sabemos que o treinamento de tiro proporcionado tanto aos profissionais da esfera pública, quanto da área privada ainda deixa muito a desejar. No ramo privado, as obrigatórias reciclagens de tiro bienais são muito pouco se você quer estar realmente em condições de bem empregar uma arma e por isso concitamos aos nossos leitores que busquem, mesmo que por conta própria, treinar mais, para assegurar que estejam mais capacitados para empregar este instrumento que pode realmente salvar sua vida e daqueles a quem você protege.

Vinícius Domingues Cavalcante, o autor, foi instrutor de tiro em diversos Centros de Formação de Segurança Privada entre 1993 e 2003, é Consultor em Segurança e Diretor da ABSEG no Rio de Janeiro.

Sobre o autor

Vinícius Cavalcante

VINICIUS DOMINGUES CAVALCANTE, CPP
Profissional de segurança desde 1985. Detém 25 cursos e estágios na área de segurança e inteligência, tendo participado de treinamentos na Colômbia e também na Grã-Bretanha. Atua como consultor em segurança nas áreas de planejamento e normatização, inteligência, segurança pessoal e treinamento. Foi um dos profissionais internacionalmente certificados pela American Society for Industrial Security (www.asisonline.org) no Brasil, sendo certificado em 2004.
Diretor regional da Associação Brasileira de Profissionais de Segurança (www.abseg.com.br) no Rio de Janeiro, há 26 anos integra a diretoria de segurança da câmara municipal do Rio de Janeiro como servidor público concursado. É membro do conselho de segurança da Associação Comercial do rio de Janeiro. Atua na segurança de pessoas de notável projeção bem como treinou efetivos de segurança pessoal de diversas instituições públicas e privadas. É instrutor convidado em cursos na PMERJ, ACADEPOL (RJ), SECRETARIA NACIONAL DE SEGURANÇA PÚBLICA E CENTRO REGIONAL DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A PAZ, o desarmamento e o desenvolvimento social na América Latina e Caribe (UN-LIREC). É articulista em publicações especializadas em segurança do Brasil e do exterior, como o Jornal da Segurança, as revistas Proteger, Security, Segurança Privada, Revista Sesvesp, Segurança & Defesa, Tecnologia & Defesa no Brasil, bem como Seguridad Latina e Global Enforcement Review e Diálogo Américas, nos Estados Unidos, e International Fire and Security.
Possui artigos sobre segurança publicados nos jornais o Globo e Monitor Mercantil. Autor de três DVDs com video-aulas sobre segurança abordando segurança de dignitários, ocorrências envolvendo artefatos explosivos e espionagem e contra-espionagem no meio empresarial, produzidos e distribuídos pelo Jornal da Segurança para todo o Brasil.

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